Segundo a presidenta, no segundo semestre o país testemunhará o
deslanche das concessões e parcerias público-privadas.
A presidenta Dilma Rousseff
falou por duas horas ao portal GGN, em entrevista exclusiva. Garantiu que o
Brasil está “em obras”, se preparando para os próximos vinte anos. A
entrevista aborda o futuro, fala do legado que a presidenta pretende deixar
para as novas gerações e revisita o que já foi feito, como os programas Bolsa
Família, Minha Casa, Minha Vida e Luz para Todos.
Ela se empolga com a nova lei
dos portos e de como a reserva do campo de Libra impactará o país. Garante que
sua próxima frente de batalha será a educação. Ela deixou claro que defende que
os royalties do petróleo sejam destinados para o setor.
Leia a
íntegra da entrevista:
O novo país
GGN – Que país a senhora
pretende que nossa geração entregue para a de nossos netos?
Dilma - Está vindo por aí
uma nova geração totalmente diferente, que encontrará um país totalmente
diferente do que nossa geração recebeu. Nós vamos transformar o Brasil em um
país rico, de classe média. Pessoalmente acho que essa herança ficará não
apenas eliminando a pobreza, mas conseguindo uma educação de altíssima
qualidade. Só a educação permite um ganho permanente, irreversível. Por isso
defendo os royalties para educação.
GGN – Qual a próximo ciclo da
economia?
Dilma – A etapa do combate à
miséria absoluta está prestes a terminar. Hoje em dia, existe o Bolsa
Família, o Minha Casa Minha
Vida, o apoio ao microempreendedor, o Luz Para Todos. Essa foi a primeira
grande leva de transformações e só tem dez anos. Os frutos ainda nem começaram
a aparecer. A segunda grande leva será a busca da competitividade.
GGN – E as frentes da próxima
batalha?
Dilma – A principal é a
Educação, que serve ao lado social e à competitividade. Há um amplo
investimento no Prouni (Programa Universidade para Todos), no FIES
(Financiamento Estudantil), na ampliação das escolas técnicas, de universidades
e novos campis. E na interiorização da educação. Levar a educação para o
interior muda padrão de vida de toda uma região.
Os analistas ainda não se deram
conta da extensão do trabalho em educação. Financiamos R$ 1,5 bilhões para o
Senai ampliar a formação de mão de obra. A Pronatec (Programa Nacional de
Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) da CNI (Confederação Nacional da Indústria)
irá formar 8 milhões de trabalhadores até 2014. O MEC (Ministério da Educação)
está entrando com recursos para formação de técnico para nível médio.
A parte relevante é o
treinamento de mão de obra com vários escalões, até chegar à Tereza Campello
(do Ministério do Desenvolvimento Social). Há várias turmas de filhos do Bolsa
Família se formando. Já chegam a um milhão de alunos.
Essa mesma parceria do Senai
estamos fazendo com o Senar (da Agricultura) e com o Senac (do Comércio). O
Senai e o Senar são os parceiros mais ativos.
O mais
interessante é a quantidade de mulheres que saem do Bolsa Família e se tornam
operárias especializadas. Na cerimônia de formação dos alunos do BF, a oradora
da turma era uma moça que se tornou eletricista.
Os marcos regulatórios
GGN – E a outra frente?
Dilma - A segunda frente são os
novos marcos regulatórios. No período Lula houve o marco do setor elétrico.
Depois, o pré-sal. Como se sabia onde havia petróleo, com risco menor de
prospecção, mudou-se a exploração para o sistema de partilha, para o país
beneficiar-se o máximo possível da nova riqueza.
GGN – E
a Lei dos Portos?
Dilma – O marco regulatório dos
portos é fundamental. No lançamento afirmei que seria a segunda abertura dos
portos. A primeira, de Dom João VI, foi para o comércio com as nações amigas. A
segunda, agora, é a abertura para o investimento privado. Há a necessidade de
um padrão de eficiência compatível com a sofisticação industrial, agrícola e a
extração de minérios.
No caso dos portos, ampliar os
terminais de uso privado, deixar quem quiser exportar através de container, sem
reserva de mercado, e ampliar a capacidade de comunicação do país com o
exterior.
Na
sequencia, o desafio será priorizar a cabotagem (navegação da costa).
Um de
nossos principais atos foi o de desobstruir a infraestrutura. Todo mundo tem o
direito de passar. Para não penalizar quem faz a infra, quem quiser passar paga
o mesmo que o concessionária cobra de si próprio.
A expansão dos portos abrirá um
novo mundo, permitindo a integração com ferrovias, com o transporte aquaviário.
Hoje em dia, temos condições de
planejar estrutura ferroviária, porque os portos são importantes, porque
rodovias estão sendo duplicadas. Eisenhower, quando assume governo
norte-americano, duplicou todas as estradas. Chefiou as Forças Aliadas na
Segunda Guerra. Planejou atravessar a França para chegar e Berlim em
determinado prazo. O planejamento fio em cima da experiência antiga com as
estradas francesas, estreitas. Quando entrou nas autobans, a chegada em Berlim
foi abreviada. Aí ele entendeu a importância das autoestradas. Levou 15 anos
para duplicar as estradas norte-americanas. Nós duplicamos os principais eixos.
O salto agrícola
GGN – Resolve-se, com isso, o
problema do transporte das safras?
Dilma -
Ninguém notou muito, mas lançamos recentemente uma política fundamental, a de
armazenagem. Precisamos de 65 milhões de toneladas de capacidade instalada de
armazéns. No último Plano de Safras, foram destinados R$ 136 bilhões para a
agricultura comercial e R$ 21 bi para a familiar. Foram colocados R$ 5,5
bilhões, a 3% ao ano de juros e prazos de 15 anos, para a ampliação da rede de
armazéns.
Ao mesmo tempo, será recriada
uma estrutura de assistência técnica e extensão rural.
A
Embrapa é uma instituição voltada para a pesquisa. A nova organização será
voltada para a assistência técnica, como agência de difusão de tecnologia. Será
enxuta e seu papel consistirá em articular consultorias privadas para atuar em
duas áreas prioritárias: agricultura de precisão e produção de
hortifrutigranjeiros em áreas protegidas (estufas), além de pesquisas em
biotecnologia, nas áreas de DNA, pecuária leiteira.
O campo de Libra
GGN – E a licitação do campo de
Libra?
Dilma - Ainda não caiu a ficha
geral sobre a próxima licitação do pré-sal, em 22 de outubro. Será licitado
apenas um campo, o de Libra. Dentro da política da ANP (Agência Nacional de
Petróleo), a Petrobras foi contratada para furar um poço. Fez a prospecção e
constatou, inicialmente, uma capacidade potencial de 5 bilhões de barris
equivalente de petróleo. Depois, pegaram os mapas de sísmica em 3D e enviaram
para análises em Londres. Os últimos dados apontam para uma capacidade de 8 a
12 bilhões de bpe. É algo em torno de 2/3 do total das reservas brasileiras descobertas
em toda sua história.
As
análises iniciais indicam um preço bastante competitivo, na faixa de 40 dólares
o barril. O gás de xisto dos Estados Unidos, tão falado, não sairá por menos de
80 dólares.
GGN – Recentemente fizemos em
Porto Alegre um seminário sobre a indústria naval e houve relatos entusiasmados
sobre os avanços no setor.
Dilma – Você não sabe a
satisfação que é quando se percebe que um objetivo foi alcançado. Lembro-me que
em 2003 o presidente Lula me chamou e disse que o Brasil já tinha sido um dos
maiores produtores de navio nos anos 70. E que queria que voltasse a ser. Fui
com a Graça Foster, titular de uma das secretarias do Ministério, até um
estaleiro abandonado.
Era um areal imenso, a perder
de vista, sem nada em cima. As pessoas caçoavam, diziam que seria impossível o
Brasil construir navios, que estava muito acima da nossa capacidade. Ora,
construir navios é a capacidade de transportar chapas e de soldar. Como,
impossível?
Hoje, quando volto aos mesmos
lugares, vemos guindastes gigantescos, o estado da arte, equipamentos
sofisticados. E com o campo de Libra, vai ser um salto ainda maior. Haverá uma
demanda gigantesca por equipamentos, de 14 a 17 plataformas, exigindo acelerar
substancialmente a indústria naval.
GGN – Por que concessões e
investimentos demoram tanto a deslanchar?
Dilma - O país paga um preço de
20 anos com austeridade fiscal e baixa projeção econômica e de investimento.
Ninguém passa imune por isso.
As
consequências foram a hipertrofia das estruturas de fiscalização em detrimento
da execução. O funcionalismo fiscal tornou-se importante; o de execução perdeu
status e incentivo. Esse fenômeno espalhou-se pelo setor privado, com os
engenheiros de produção cedendo lugar aos engenheiros voltados para a área
financeira e de gestão. Desapareceram as grandes empresas de consultoria de
engenharia.
O planejamento de longo prazo
retornou ao país em 2007, com o primeiro PAC (Plano de Aceleração do
Crescimento). Ninguém mais fazia projetos, nem a União, nem os estados nem a
iniciativa privada estavam preparados para enfrentar o desafio.
De lá
para cá houve expressiva mudança qualitativa. Hoje em dia União, estados e
iniciativa privada estão mais aparelhados, as empresas de projetos são bem
melhores, com impacto no ritmo das obras. Houve modificações nos sistemas de
contratação, reduzindo o tempo, melhoria na capacidade de planejar.
GGN – Quando as concessões
deslancharão?
Dilma - Na segunda metade do
ano, haverá um festival de licitações. Serão licitados 7.500 km de rodovias,
aeroportos, ferrovias, o poço de Libra, gás em terra, armazéns, linhas de
transmissão e geração e o TAV (Trem de Alta Velocidade). Os empresários
internacionais já acordaram para isso.
(Portal
GGN)